Uma rua da periferia. Um garoto, onze anos, pedinte, sem rumo certo, apenas caminhava. Era dia, e a sensação térmica era de muito calor. O garoto, sujo e de aparência caquética, não aparentava se incomodar com o suor. Ele avistou um bar, onde havia dois homens sentados numa mesa e tomando uma cerveja aparentemente bem gelada. Ambos conversavam exaltadamente. Nesse bar, as mesas ficavam na calçada. O menino se dirigiu ao bar, parou diante dos dois homens e observou-os com seus olhos tristes e amarelos:
- Não adianta fazer doações para a África! Se adiantasse, a África não seria ainda hoje o continente mais pobre! Para que doação, se ninguém garante o acesso da população a essa ajuda?
- A questão é que as doações têm que oferecer oportunidade de renda aos africanos! Investir na agricultura familiar, por exemplo, seria um destino promissor para essas ajudas!
- E como fazer isso se o governo for corrupto? Os países africanos estão entre os países com maior índice de corrupção do mundo! Quem vai distribuir e fiscalizar esse dinheiro, se o próprio governo abandonou o seu povo? Já me disseram que esses governos, com uma parte das doações, distribuem cestas básicas de forma assistencialista e aproveitam a situação para comprar votos durante as eleições! O povo, manipulado, vota neles e ainda se acomoda esperando mais cestas básicas. A doação torna-se moeda eleitoral!
- Não é necessário governo para isso! Concordo que seria o ideal, mas é possível não depender do governo. Uma prova disso são as ONGs! E doações não necessariamente precisam ser alimentos! Existem auxílios empreendedores que hoje mudam significativamente a vida dos africanos. A doação, nesses casos, torna-se uma esperança para a vida daquelas pessoas que nunca tiveram oportunidade!
O menino, assustado e confuso, atento às palavras dos homens entusiasmados com a discussão, finalmente ia pedir uma ajuda em dinheiro, quando foi repreendido pela continuação da conversa:
- Doação é esmola! Um rico dá dinheiro a um pobre para alimentar o próprio ego e aliviar a consciência! Esmola não enriquece ninguém e só ajuda o pobre a aceitar sua condição inferior perante a sociedade! Desse mesmo modo funciona entre os países! São justamente países ricos como EUA, Japão, Reino Unido, França e Alemanha os que mais ajudam financeiramente a África. O pobre que depende de esmola nunca deixará de ser pobre!
O garoto, ao ouvir aquilo, botou rapidamente a mão no bolso, retirou suas moedas e as colocou na mesa. Até esse momento, os homens, ludibriados com a conversa, não tinham notado a presença da criança. Eles se calaram surpreendidos, e um deles, após um instante de silêncio, perguntou-lhe:
- Por que esse dinheiro na nossa mesa, garoto?
O menino respondeu, com esperança:
- Não quero mais ser pobre! Estão aqui todas as minhas esmolas! Se é isso que me deixa com fome todo dia, então não quero esse dinheiro!
Os dois homens, ambos jovens universitários, baixaram suas cabeças e miraram o chão culpados e envergonhados. O menino, radiante com a notícia, correu provavelmente ao encontro da mãe para lhe contar que não eram mais pobres.